sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Viperina

O cérebro é como um músculo, precisa de constante exercício para se manter em forma, para corresponder às exigências que as actividades que desenvolvemos exigem.

Foi com este pressuposto que me surgiu recentemente uma preocupação incómoda, que me ocupava a mente com o seguinte pensamento: "como irei eu corresponder às espectativas dos leitores exigentes que diariamente visitam este blog, meses depois de ter contribuído com a minha última mensagem? (talvez um "smile" fica-se bem aqui, mas não me vou dar a esse trabalho)".

A resposta veio com um exemplar da inigualável revista "Nova Gente" que a minha querida mãezinha, por esquecimento, deixou cá por casa. Qual Epopeia, a referida revista abriu-me as portas para uma indignação sem precendentes, de tal forma que me passou pela cabeça enviar um e-mail aos ilumidos membros da sua redação.

E basta de introdução: o que quero partilhar convosco é o e-mail que há dois dias enviei para novagente@impala.pt:


Assunto: Viperina, um Novo Mundo a Descobrir

«Muito boa noite:

A Internet é um meio poderoso de comunicação, de troca de informação sob os mais diversos formatos, e dada esta sua versatilidade, permite-nos até disparar críticas nos mais diversos sentidos, para as mais diversas entidades e para os mais diversos autores. Coisa engraçada a Internet!
Ora no sentido de usufruir destas possibilidades que a Internet nos oferece, decidi eu hoje abrir o meu mail para compôr uma mensagem, tentando desesperadamente remediar a azia que a leitura de alguns simples parágrafos me causou:

Sendo a minha pessoa um estudante universitário folgado, dei por mim, a certa altura, a folhear uma abençoada revista, que a minha querida mãezinha por aí deixou perdida. Chamava-se "Nova Gente", capa de elite, destacando a figura de Marina Mota, ao lado de letras gordas, dizendo "ELA TEM FILHOS ADOPTIVOS".
Obviamente essa notícia não me pareceu digna de qualquer capa de revista, seja ele de que temática for, mas não venho, todavia, ser o crítico típico, ainda crente de que um dia a capa da revista será algo como "DESCOBERTA DE VIDA EXTRA-TERRESTRE EM PLANETA BUÉ LONGE". Não... Para isso, felizmente, existem outras revistas dedicadas aos temas. A senhora Marina Mota é uma figura pública. Sim senhor! Há que explorar a sua vida, trazer a público o que de bom e de mau lhe tem acontecido, de tal forma que se poderá aproximar a sua figura ao comum do cidadão. É um bom exercício de lazer, e faz falta a todos (os que paciência têm para se dedicar a estas leituras). Até aqui tudo muito correcto, sem qualquer ironia o digo.

Procurava eu então um "Sudoku" na última página. Qual não é o meu espanto ao descobrir que, na referida página, ainda sobravam restos de quotidiano famoso para adocicar o paladar dos que mais não fazem do que viver uma vida que não é sua. Em vez do tão desejado "Sudoku" encontro uma secção cujo título é "Viperina".
"Ah, sim senhor" pensei eu. "O melhor guarda-se para o fim, é bem visto...". Só que aqui não encontro reportagens cuidadas, bem elaboradas e estruturadas, como as poucas que havia lido até então. Não encontro sequer o nome do(a) autor(a), o que me parece de muito mau gosto face aos comentários aí «escarrados», perdoem-me o termo.

A título de exemplo, deixo aqui citados os seguintes:
"O Nuno Guerreiro não pára de falar em público do pai e das suas relações com ele. Conta intimidades e conflitos, arrependimentos e remorsos. Ó querido, este tipo de psicanálise costuma fazer-se em privado e deitado num divãzinho. Tá?!"
"Encontrei num evento o Eduardo Beauté e o Luís Borges, apaixonadérrimos. Quero eu dizer: em êxtase. Como dizia a minha tia Frederica, quando há amor, a diferença de idades não conta..."

Duas reacções imediatas do meu delicado cérebro:
1 - Aposto a minha mesada em como a senhora que escreveu isto fala como se tivesse uma mola a tapar-lhe o nariz.
2 - Que merda é esta, pah?!

Como disse no início desta minha mensagem, a Internet permite-nos, por este meio, expressar as nossas opiniões só porque sim, e torna-se até muito fácil enviar uma crítica directamente para a pessoa, mais ou menos mediática, mais ou menos famosa, e esfregá-la com gosto na cara, qual injúria! Agora expliquem-me só, como poderei eu entrar em contacto com uma pessoa a quem desejo ardentemente criticar, sendo que os seus disparates vêem a público como que encobertos no mais profundo dos anonimatos?
No seguimento, desculpo-me então à primeira pessoa que ler este e-mail, pois dificilmente será ela a autora da luxuosa secção "Viperina", a quem eu chamarei, "Autora do Mais Profundo Saber". E caso este extenso e rabuscado e-mail chegue a ser lido e compreendido na íntegra pela "Autora do Mais Profundo Saber", fica-lhe a seguinte mensagem:

«Minha Cara:

venho por este meio expressar a minha mais profunda admiração pela sua capacidade extrema de escrever linhas infinitas acerca de assuntos tão triviais e fúteis que nem merecem a honra de serem pensados, e aproveito para a avisar que o seu jeito de escrita sem classe disfarçado de "chique" quase consegue desafiar a inteligência de uma cria de chimpanzé. O meu reconhecimento!

Com os melhores cumprimentos,
o seu leitor nada assíduo que imitando a sua pessoa, não será dará ao trabalho de divulgar o nome.

P.S. ("post-script" para mim, "panachê e sardinha-curta" para si): Obviamente escrevi estas minhas frases com uma mola no nariz. Não quero jamais ficar-lhe atrás!»


Grato pelo tempo dedicado a esta leitura, e com os melhores cumprimentos,
o mesmo sujeito de cima.»


Aguardo impacientemente uma resposta, que não espero menos insultuosa que o e-mail que enviei. De qualquer forma, comprometo-me a públicá-la aqui, qualquer que seja o seu conteúdo.
E deixo o meu agradecimento os meus restantes colegas que, com as suas expressões me inspiraram a este e-mail, como deverão ter reparado ;)

Tudo de bom!